sexta-feira, 5 de março de 2010

Cativar



E foi então que apareceu a raposa:
- Boa dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu polidamente o principezinho, que se voltou, mas não viu nada.
- Eu estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira...
- Quem és tu? perguntou o principezinho.

Tu és bem bonita...
- Sou uma raposa, disse a raposa.
- Vem brincar comigo, propôs o principezinho. Estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa.


Não me cativaram ainda.
- Ah! desculpa, disse o principezinho.
Após uma reflexão, acrescentou:
- Que quer dizer "cativar"?
...
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa.

Significa "criar laços..."
- Criar laços?
- Exatamente, disse a raposa.

Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos.

E eu não tenho necessidade de ti.

E tu não tens também necessidade de mim.

Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas.

Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro.

Serás para mim único no mundo.

E eu serei para ti única no mundo...

- Minha vida é monótona.

Eu caço as galinhas e os homens me caçam.

Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também.

E por isso eu me aborreço um pouco.

Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol.

Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros.

Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra.
O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música.

E depois, olha!

Vês, lá longe, os campos de trigo?

Eu não como pão.

O trigo para mim é inútil.

Os campos de trigo não me lembram coisa alguma.

E isso é triste!

Mas tu tens cabelos cor de ouro.

Então será maravilhoso quando me tiveres cativado.

O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti.

E eu amarei o barulho do vento no trigo...
A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor... cativa-me! disse ela.
- Que é preciso fazer? perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa.

Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva.

Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada.

A linguagem é uma fonte de mal-entendidos.

Mas, cada dia, te sentarás mais perto...

No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa.

Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz.

Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz.

Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada:

descobrirei o preço da felicidade!

Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração...
Assim o principezinho cativou a raposa.

Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:
- Ah! Eu vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, eu não queria te fazer mal;

mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Quis, disse a raposa.
- Mas tu vais chorar! disse o principezinho.
- Vou, disse a raposa.
- Então, não sais lucrando nada!
- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo.

- Adeus, disse a raposa.

Eis o meu segredo.

É muito simples: só se vê bem com o coração.

O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa.

Mas tu não a deves esquecer.

Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas.

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